domingo, 7 de dezembro de 2014

Sobre Estado e corrupção..


No contexto da disputa eleitoral entre Dilma e Aécio, conversava com alguns amigos sobre corrupção. Diziam eles que a corrupção no governo Dilma não era argumento para votar no Aécio porque o PSDB era um partido também muito corrupto, argumento do qual não posso discordar (apesar da corrupção no governo do PT ter alcançado dimensão e organização nunca antes vistos na história desse país).

Entretanto, para além dessa disputa entre partidos – que mais parece um jogo de futebol, com torcidas apaixonadas incapazes de ver um pênalti claro – podemos nos dedicar um pouco a investigar quais práticas e características de um sistema político mais favorecem ou dificultam o roubo do dinheiro público. Não são poucos os pesquisadores que se dedicam a estudar os fatores que determinam a intensidade da corrupção em diferentes países. Não é possível que não tenhamos nada a aprender com eles.

Obviamente, a corrupção depende da moral de uma sociedade, ou seja, do grau de coletivismo, solidariedade e, principalmente, honestidade, presentes nos valores dessa sociedade. Aqui fica clara a distância à qual nos encontramos de países como Noruega, Finlândia, Canadá, etc. Isso demonstra a importância de cultivarmos bons valores junto às nossas crianças, para fortalecermos e acelerarmos o amadurecimento do Brasil como nação. Todavia, não se pode esperar grandes mudanças nessa variável no curto prazo. É claro que a educação formal ajuda, mas trata-se de valores que se reproduzem muito mais através de exemplos (especialmente na família) do que através de um parágrafo em uma apostila de Ciências Socais da quarta série. Basta analisar o grau de coletivismo e honestidade dos nossos 513 deputados, em sua imensa maioria, com ensino superior completo.

Mas a corrupção não é determinada apenas por fatores sobre os quais pouco pode ser feito. A adoção de bons mecanismos de controle e a transparência têm produzido resultados positivos (apesar de discretos) sobre a corrupção. Ferraz e Finan (2007) apontam o peso da imprensa no combate à corrupção. Brunetti e Weder (2003) encontraram forte correlação negativa entre o nível de liberdade de imprensa e a prática de corrupção (quem defende controle de imprensa no Brasil?).

Mas não há como continuar essa conversa sem irmos direto ao principal: o volume de recursos do povo roubado dos cofres públicos é, obviamente, diretamente proporcional ao volume de recursos do povo tomado pelo poder público. Em outras palavras, o nível de corrupção pode ser alto ou baixo, mas o volume de dinheiro roubado do Estado será proporcional ao tamanho do Estado. Quanto mais impostos, órgãos administrativos, empresas estatais, regulamentações, normas, licenças de importação tivermos, mais oportunidades haverá para os gatunos do dinheiro público. Quanto mais liberdade econômica, comercial, financeira, trabalhista, enfim, quanto menos governo, menos corrupção.

“Ah, mas também há corrupção no setor privado”, diriam alguns. Se a frase faz referência ao desvio de dinheiro das empresas por funcionários, não se trata de dinheiro público, azar do dono. A competição fará o favor de punir as empresas que convivem com fraudes do tipo. Se a frase faz referência à associação de agentes privados com servidores para roubar dinheiro público, é exatamente do que estamos a tratar aqui. E quanto menos Estado, menos oportunidade para essa associação criminosa. A tese não é nova. Alesina e Angeletos (2005) já apontavam uma relação de trade-off entre a intervenção governamental e corrupção. Rose-Ackerman (1975), bem como Ades e Di Tella (1999), defendem uma relação entre o nível de concorrência e a prática de corrupção. Encontram evidências de que mercados beneficiados por monopólios ou isolados por políticas de barreiras comerciais tendem a ter mais corrupção do que mercados livres.

Apesar de elementar, há quem não acredite na tese, que contraria aquilo que muitos defendem desde que conheceram aquele espetacular professor de história do segundo colegial, e me obrigam a tirar uma manhã de domingo para investigar empiricamente a relação entre liberdade econômica e corrupção.

A Transparência Internacional publica anualmente um ranking de corrupção. Como a mensuração da corrupção é bem difícil, medem pela percepção da corrupção, que costuma acompanhar bem algumas proxys criadas pelos estudiosos da área (tem um sujeito que analisou o número de multas de trânsito dos carros de diferentes embaixadas na ONU, em Nova Iorque, hehe). O Índice de Liberdade Econômica, publicado pela Heritage Foundation, é uma ponderação de dezenas de indicadores organizados em dez categorias: liberdade comercial, mercado de trabalho, carga tributária, regulamentação financeira, direito a propriedade, inflação, etc.

Plotei os dados por dispersão no gráfico abaixo.




Como se pode ver, quanto menos liberdade econômica, mais corrupção (jura?!). Para os curiosos, aquele país abaixo e à direita é a ‘melhor’ Coreia. O primeiro à esquerda, Nova Zelândia. Não há dados de Cuba.

O sujeito pode ainda dizer que precisamos de um Estado grande para alcançarmos objetivos sociais. Discordo da tese, mas respeito a opinião. O ponto aqui é compreender que a corrupção é consequência direta desse Estado grande.

Logo, pode ser mesmo que todos os partidos brasileiros sejam igualmente corruptos. Porém, no que diz respeito à corrupção, levar em consideração o projeto de Estado que cada partido defende na hora de decidir seu voto é fundamental para aqueles que desejam que o combate à corrupção vá além de belas palavras.

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